«O cidadão tem sido, desta forma
espoliado e enganado. Aplaudiu a Expo 98 e achou muito bem que se ressuscitasse
uma parte da cidade de Lisboa, que de facto merecia ser requalificada, mas
ficou com uma dívida milionária pelos milhões que foram malbaratados.
Entusiasmou-se, por patriotismo, com a realização do Euro 2004, e acabou a
aplaudir um evento que levou à construção de estádios inúteis, a um preço
incomportável, que nunca serão rentabilizados. Apreciou o benefício de novas
pontes e estradas que facilitam o seu dia-a-dia, mas que lhes custarão a
reforma e o bem-estar dos seus filhos. O país encheu-se, de lés-a-lés, com
equipamentos desnecessários, muitos deles ridículos pavilhões multiusos com
capacidades exageradas, piscinas municipais que não têm orçamento para aquecer
a água, fluvinas em locais onde não há barcos, estátuas indecorosas em rotundas
desnecessárias, museus sem conteúdos ou públicos. O país, velho e pobre,
adoptou os tiques dos novos-ricos. Naturalmente, o cidadão gosta do luxo quando
dele beneficia e quando não conhece o seu custo; e, pelo caminho, aplaude e
elege quem mais lhes promete, e garante, tão generoso benefício. Por norma,
gosta de obra, mesmo que seja de fachada, e toma como pessimista qualquer político
que lhe tente contar a verdade dos factos ou como economicista quem lhe tente demonstrar
a dimensão do logro. Provavelmente, continuará a fazê-lo, continuará a
beneficiar o infractor, porque lhe dizem que são precisas politicas de
crescimento e de investimento, porque ninguém lhe explica que o investimento
tem um custo que deve ser associado ao beneficio e, por isso, elegerá o autarca
que lhe prometa mais do mesmo, ainda que não haja fontes de financiamento para
isso.»
Retirado do
livro “Ultimato” de Rui Moreira.
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