sábado, 10 de julho de 2010

Ensaios de Amor

«O amor não é igual para todos, é construído e definido por diferentes sociedades. Pelo menos numa, a dos manus, da Nova Guiné, nem sequer existe uma palavra para amor. Noutras culturas, o amor existe, mas assume formas especiais. A poesia amorosa do antigo Egipto não se interessa por emoções como vergonha, culpa ou ambivalência. Os gregos não davam importância à homossexualidade, o cristianismo proscreveu o corpo e glorificou a alma, para os trovadores o amor equivalia à paixão não correspondida, os românticos fizeram do amor uma religião, e S. M. Greenfield, casado e feliz, num artigo publicado num exemplar do Sociological Quarterly que li no dentista, defende que o amor é hoje fomentado pelo capitalismo moderno apenas para:

... motivar os indivíduos - sempre que não haja outra forma de o fazer - a desempenhar as funções de esposo-pai e esposa-mãe e constituir famílias nucleares, essenciais não só para a reprodução e a socialização, mas também para a manutenção dos meios de distribuição existentes, para o consumo de bens e serviços e, de uma maneira geral, para o bom funcionamento do sistema social, de modo que ele não deixe de ser uma empresa operacional.
»

(...)

«Temos de partir do principio de que há certas lições a retirar do amor, quando não, passaríamos o resto da vida a repetir os mesmos erros, como as moscas que endoidecem às marradas nas vidraças das janelas, incapazes de perceber que, embora o vidro seja transparente, não se pode atravessá-lo. Não haverá também determinadas verdades básicas a aprender, fragmentos de sabedoria que podem evitar alguns entusiasmos excessivos, alguma dor, algumas amargas desilusões? Não será uma ambição legitima desejar ser sábio no amor, tal como se pode ser sábio no que toca a alimentação, morte ou dinheiro?
»

Retirado do livro "Ensaios de Amor" de Alain de Botton, o mesmo de "A Arte de Viajar" já aqui referido.

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